Por que eu preciso de uma Igreja?

Fé e saúde emocional
22 de setembro de 2020

Antes de tudo, devemos considerar a pertinência deste questionamento. Pode ser uma dúvida espiritual sincera, meramente uma curiosidade, ou mesmo uma pergunta motivada pelo complexo cenário religioso que vivemos. Precisamos de uma resposta clara e objetiva a respeito do porquê na fé cristã é imperativo o pertencimento a uma comunidade de fé chamada Igreja. 

O tema pode ser explorado por diversos ângulos. No entanto, uma resposta que seja espiritualmente suficiente para embasar nossas escolhas e decisões deve estar fundamentada na Palavra de Deus. 

Nesse sentido, quando olhamos a Escritura, percebemos que no Antigo e no Novo Testamento, Deus estabeleceu o seu relacionamento com a humanidade por meio de um povo. No Antigo Testamento, Israel era o povo de Deus. A missão de Israel era ser testemunha da graça de Deus às nações, a fim de que outros fossem inseridos na comunidade do povo de Deus. O Senhor estabeleceu uma aliança com a descendência de Abraão. Ele institui o tabernáculo e depois o templo como locais ordinários para a manifestação da sua presença no meio do povo. Ele revelou sua lei, estabeleceu reis e sacerdotes, e enviou profetas para orientar espiritualmente este mesmo povo. 

A partir do Novo Testamento, Deus envia o seu Filho. Jesus é o filho de Deus encarnado, que nasce em Israel, como legítimo representante do povo de Deus. Nele, todas as instituições do Antigo Testamento encontram o seu cumprimento: a lei, o templo, o sacerdócio, as profecias se cumprem em Jesus. A partir de então participamos da aliança da graça de Deus exclusivamente por meio da fé em Jesus Cristo.

Sem perder de vista nosso tema, devemos notar: Deus estabeleceu sua aliança com um povo. Por meio de Jesus, a aliança não foi anulada. Ela foi cumprida e ampliada. A aliança de Deus continua sendo com um povo. Todavia, o povo de Deus a partir de Jesus não é mais identificado por nacionalidade, raça ou cultura, mas sim pela fé em Cristo (Gálatas 3.28-29; Efésios 2.11-22; 1 Pedro 2.10).

Dessa forma, vemos que a obra de Deus em Jesus não era apenas salvar pessoas, mas instituir uma comunidade de discípulos (Tito 2.14). Assim, durante o seu ministério, Jesus reuniu doze discípulos. O Filho de Deus, 100% divino, não desenvolveu um ministério sozinho. Ele chamou pessoas para andar com ele: “Então, designou doze para estarem com ele…” (Marcos 3.14). Ele os ensinou e treinou, depois os enviou para fazerem novos discípulos: “Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra. Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo” (Mateus 28.18-19).

Jesus, durante o seu ministério, construiu uma comunidade de discípulos e os enviou para fazer novos discípulos, que por intermédio do batismo seriam inseridos nesta comunidade.

No livro de Atos, vemos Jesus cumprindo a promessa que fez durante o seu ministério. Ele envia sobre a comunidade dos discípulos o Espírito Santo. Repare: o Espírito de Deus não foi derramado sobre cada um dos discípulos de forma individual e separada. O Pentecostes acontece quando os discípulos de Jesus “estavam todos reunidos no mesmo lugar” (Atos 2.1). No Pentecostes, nasce de forma plena a Igreja de Cristo no mundo, como comunidade capacitada espiritualmente a expandir o reino de Deus. 

Logo após o Pentecostes, o Evangelho é proclamado e pessoas confessam Jesus como Senhor e Salvador. Elas são batizadas e admitidas na comunidade, que é descrita por Atos da seguinte forma: “todos os que creram estavam juntos” (Atos 2.44). 

Diante do exposto, na dinâmica história da salvação narrada nas páginas da Escritura, Deus constituiu um povo, e por meio do Evangelho nos chama a fazer parte desse povo. No Antigo Testamento esse povo era Israel. A partir do Novo Testamento, é a Igreja.

Quando falamos de Igreja, portanto, não falamos de mera instituição humana. Trata-se da comunidade dos discípulos de Jesus, instituída por ele mesmo no seu ministério, e capacitada pelo derramamento do Espírito Santo. 

Do ponto de vista bíblico-teológico, o relacionamento com Deus é caracterizado por dois aspectos: pertencimento e comunhão. O que marca o pertencimento é o batismo e a participação em uma Igreja local. A Igreja é a comunidade dos batizados, pois o batismo é o selo daqueles que fazem parte da Igreja do Senhor na terra. Não existe na Escritura a possibilidade de eu querer Jesus e não querer a Igreja, pois ela é o corpo de Cristo na terra. Jesus se identifica com seus discípulos a ponto de afirmar que aqueles que os recebem, estarão recebendo o próprio Jesus (Mateus 10.40). Fé sem batismo encontramos no Novo Testamento apenas no caso do ladrão da cruz, que por razões óbvias, não teve a oportunidade de ser batizado. 

Argumentar em favor de uma vinculação exclusiva a Igreja como organismo espiritual invisível, é ignorar a maneira como o texto bíblico descreve a realidade da Igreja. De fato, pela fé em Cristo somos salvos e admitidos na comunidade invisível formada espiritualmente por todos os salvos em todas as épocas e lugares. Porém, a vivência da nossa fé acontece em uma comunidade específica, constituída pelos cristãos de uma determinada localidade, que assumem o mútuo compromisso de caminharem juntos. Isso nos leva ao segundo aspecto do nosso relacionamento com Deus que entra em consideração aqui. A comunhão. 

Basta um olhar superficial nos livros do Novo Testamento que encontraremos uma série de imperativos aos relacionamentos espirituais comunitários: “Acolhei-vos uns aos outros” (Romanos 15.7); “Sede, antes, servos uns dos outros, pelo amor” (Gálatas 5.13); “Levai as cargas uns dos outros” (Gálatas 6.2). Hebreus 10.25 exorta contra aqueles que estavam deixando de reunir-se com a comunidade: “Não deixemos de congregar-nos, como é costume de alguns”. 

A perspectiva bíblica é que o exercício comunitário da fé é um instrumento de edificação para nossas vidas. Esse é o papel dos dons espirituais. Conforme a explicação de Paulo em 1 Coríntios eles funcionam na Igreja assim como os órgãos e membros no corpo humano. Cristãos diferentes, com dons espirituais distintos, que se edificam mutuamente pelo exercício dos seus dons. Um cristão sem Igreja é como se o pé ou mão ou os olhos quisessem uma existência separada do corpo (1 Coríntios 12).

E certamente nada melhor que a celebração da Ceia para expressar o aspecto comunitário da fé. E quando estamos juntos, reunidos como Igreja do Senhor para cultuar, que compartilhamos com todos os batizados presentes o pão e o vinho. Note que inexiste na Bíblia o “auto batismo” ou “a ceia particular”. Somos batizados na Igreja e pela Igreja. Celebramos a Ceia com a Igreja. 

Para concluir, não podemos ignorar o fato de que nem toda comunidade que se intitula Igreja atende aos requisitos bíblicos daquilo que caracteriza o corpo de Cristo. Há comunidades que começaram como Igreja e deixaram de ser. Infelizmente, o Novo Testamento já nos alertou que lobos entrariam no rebanho, que falsos mestres anunciaram outro evangelho, que o joio iria estar misturado ao trigo. Nas palavras de Jesus: “nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus” (Mateus 7.21). Não é pecado mudar de Igreja. Não é errado romper com lideranças que não tem qualquer compromisso com a Palavra de Deus. Não é pequeno o estrago emocional e espiritual que falsos líderes e falsas comunidades religiosas causam. É direito e dever seu orar e procurar uma comunidade bíblica e saudável, comprometida com os valores do reino de Deus. 

O que não podemos, entretanto, é renunciar a Igreja, porque ela é projeto de Deus para abençoar nossas vidas e é a única agência estabelecida pelo próprio Jesus para a implementação do reino de Deus. Não há “plano B.” No Evangelho revelado nas páginas da Escritura, Deus espera que você vivencie o relacionamento com ele através da fé em Jesus, em uma comunidade de fé chamada Igreja.

Pastor Jackson Willian

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